terça-feira, 27 de outubro de 2009

O suicídio de trabalhadores - PARTE IV

IHU On-Line – Os sindicatos dos bancários têm colocado em pauta esse tema?

Marcelo Finazzi – O suicídio, de forma específica, somente esteve em pauta nos anos 1990, por conta de uma onda de suicídios na categoria. Houve audiências no Congresso Nacional para tratar do assunto, inclusive, com ampla repercussão dos casos na mídia. Posteriormente, o tema caiu no esquecimento, mas perdurou no imaginário dos bancários: é interessante que, em conversas com trabalhadores mais antigos, todos conhecem alguma morte. Por outro lado, tenho observado, por meio da leitura dos informativos editados pelos sindicatos, que tais entidades estão empenhadas em denunciar práticas gerenciais degradantes e alertar a categoria sobre os malefícios dos assédios, além de disponibilizar assessoria especializada em segurança e saúde no trabalho.         

IHU On-Line – O senhor tem conhecimento de evidências de altas taxas de suicídios em outras categorias de trabalhadores?

Marcelo Finazzi – No Brasil, encontrei somente um único estudo sobre o suicídio no contexto do trabalho. No Japão, por exemplo, o assunto é muito pesquisado, e há evidências significativas, publicadas em respeitados periódicos científicos, de que os métodos de gestão empregados por lá, os quais inspiraram (e ainda inspiram) as reestruturações produtivas mundo afora, têm sido diretamente associados a ocorrências de desordens mentais e suicídio de trabalhadores japoneses. Principais causas: falências de empresas, programas de demissão e trabalho sob condições severas. Cabe ressaltar, porém, que muitos pesquisadores brasileiros têm estudado os efeitos deletérios da organização do trabalho sob a subjetividade do trabalhador, evidenciando práticas gerenciais perniciosas nos mais variados formatos organizacionais.

Destaco, por exemplo, aqueles que se dedicam à psicodinâmica do trabalho, à sociologia clínica, aos estudos organizacionais críticos e à saúde do trabalhador. De forma prática, estudar o suicídio é tarefa árdua. Estudar o suicídio, no contexto do trabalho, é ainda mais difícil: as bases de dados oficiais não são muito confiáveis; os dados com relativo nível de confiabilidade restringem-se aos anos recentes; há sérios problemas de subnotificação de suicídios; familiares e amigos têm vergonha ou repulsa de falar sobre o assunto – que é tabu em nossa sociedade; em muitas empresas, o trabalhador é demitido ao primeiro sinal de distúrbios físico ou mental, e as terceirizações diluem o tamanho das categorias profissionais. Por fim, as empresas costumam esconder as ocorrências ou, quando isso não é possível, fazem o possível para minimizá-las, atribuindo os óbitos a problemas pessoais do falecido, distúrbios psiquiátricos ou, em última instância, fazem comparações epidemiológicas absurdamente descabidas entre as taxas de suicídio da empresa e... do país! Categorias de trabalhadores potencialmente sujeitas ao sofrimento são daqueles setores muito competitivos: eu apostaria pesquisar os trabalhadores das empresas de telecomunicações brasileiras, incluindo aqueles que perderam os seus empregos. É possível que os resultados sejam assustadores.

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